Direito Nosso

Tolerâncias religiosas do estado laico

GILBERTO GARCIA*

Num artigo publicado recentemente na grande imprensa nacional, foi feito um importante alerta para a sociedade brasileira, com relação ao Estado Laico, vigente em país há mais de um século, por força da Constituição Republicana de 1891.

Em que pese não concordarmos com todos os seus termos, alguns deliberadamente exagerados e, “data vênia”, preconceituosos, entendemos altamente pertinente uma de suas asseverações, “… É preciso que o Estado laico imponha limites à intolerância religiosa …”, evidentemente dentro dos preceitos contidos em nossa Carta Magna, que estabelece a Separação: Igreja x Estado, que é um dos fundamentos da República Federativa do Brasil.

Entretanto, cremos que no citado artigo faltou, uma indispensável alusão, especialmente em função do dia da publicação, 12 de outubro, a tolerância religiosa do Estado Laico possuir um feriado nacional num dia dedicado, segundo à lei federal, a veneração de um símbolo de fé, onde todos são obrigados, quaisquer seja sua vertente de crença, a “guardar um dia” que é especifico de um grupo religioso.

Vale registrar que é direito, no seu exercício de fé, venerar sua padroeira, o que este grupo religioso faz há setenta e cinco anos, contudo a lei que criou o feriado nacional religioso obrigando a todos foi instituída em 1980.

Esta é uma indevida intervenção do poder público no direito particular de cada cidadão crer, ou não crer, no que lhe for conveniente pessoalmente, devendo sofrer as penalidades previstas no ordenamento jurídico nacional, em caso de infringência das normas asseguradoras do bom convívio social.

Cremos que já é tempo da grande mídia brasileira, escrita, falada e televisada, quando assumir posicionamentos, que é seu direito, e para o bem da democracia, dever, perceber que nosso país é uma democracia multirracial, pluralista e diversificada, por isso, propaga-se a convivência religiosa, que se interpreta como respeito a dignidade da pessoa humana, que é fundamento assegurado pela sociedade civil organizada.

Nenhum de nós brasileiros quer que se repita, qualquer seja a motivação, a famosa “Noite de São Bartomoleu”, exatamente porque concordamos com o articulista, em face de nossa cultura pátria, ser impensável e impertinente, qualquer proposição de um “Estado Fundamentalista” tenha ele qualquer vertente de fé.

Por isso, os grupos religiosos, independente de seu tempo de existência, de seu patrimônio, de suas influências políticas, de sua quantidade de fiéis, de seu potencial financeiro etc, para resguardo de todos os cidadãos, devem ser tratados pelo Estado Laico de forma igualitária.

As Igrejas e Organizações Religiosas, que tem o direito de se auto-regulamentar, com base no Código Civil, devendo prestar contas a sociedade civil organizada, nas questões administrativas, associativas, patrimoniais, financeiras, tributárias, trabalhistas e penais, eis que, são o instrumental através das quais nossa “brava gente brasileira” exercita sua fé, que é direito subjetivo e personalíssimo, o que deve ocorrer de forma privada, eis que direito constitucional assegurado no artigo 5o da Carta Magna Nacional.

Estamos sim, diante de Tolerâncias Religiosas deste Estado Laico, eis que, numa afronta a princípios constitucionais republicanos, como o contido no artigo 19, inciso I, da CF/88, que veda o estabelecimento de cultos oficiais, pelo poder público, como os feriados religiosos, fixados por lei, que ocorrem, no país: Dia da Padroeira do Brasil, e em inúmeras localidades que o Dia do Padroeiro da Cidade é Feriado Municipal, além de outros, como na Cidade do Rio de Janeiro: Dia de São Jorge, em Brasília: Dia do Evangélico.

Por outro lado, registramos, que um Juiz Federal (católico) no Rio Grande do Sul determinou a retirada de crucifixos da Sala de Audiências; de um Prefeito (espírita) que mandou retirar as imagens e símbolos religiosos das repartições públicas de um município em Minas Gerais; de um Canal de TV Evangélico que foi condenado judicialmente a exibir programação afro-religiosa em São Paulo; e numa outra vertente, em Porto Velho(RO), a Câmara de Vereadores aprovou projeto de Lei Municipal que declara, “profeticamente, Jesus Cristo como único Senhor e Salvador”.

Devemos estar alertas, para a defesa do Estado Laico, onde o poder público, em qualquer nível, federal, estadual, ou municipal, ou nas três esferas, executivo, legislativo ou judiciário, é limitado constitucionalmente, não podendo interferir, prejudicando ou beneficiando, nas questões de fé, religiosidade e espiritualidade dos cidadãos brasileiros.

Gilberto Garcia é Advogado, Pós-graduado e Mestre em Direito. Site www.direitonosso.com.br